Tratamento Cirúrgico da Dor Crônica e/ou Neuropática

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Tratamento Cirúrgico da Dor Crônica e/ou Neuropática: A dor crônica persistente pós-operatória (DCPO) constitui um grave problema de saúde, incapacitante, mina a qualidade de vida dos pacientes acometidos. Apesar de mais estudos e pesquisas terem sido desenvolvidos a respeito dos possíveis mecanismos da evolução da dor aguda para dor crônica pós-operatória, ainda não existem dados consistentes a respeito de seus fatores de risco e prevenção. Este artigo se propõe a trazer o que há no panorama da literatura atual disponível.

Tratamento Cirúrgico da Dor Crônica e/ou Neuropática

A pessoa que sente dor por mais de 3 meses seguidos apresenta, por definição, dor crônica, devido a um mecanismo de sensibilização do sistema nervoso medial, podendo levar também ao desenvolvimento de dor neuropática, com sintomas porquê queimação, peso, agulhadas ou choques, acompanhadas ou não de formigamento ou entorpecimento.

O tratamento cirúrgico da dor inclui a realização de infiltrações, bloqueios e procedimentos minimamente invasivos para implante de eletrodos para estimulação da medula espinhal ou para implante de petardo de fármacos. Estas técnicas estão demonstrando eficiência e segurança para os pacientes que sofrem com dor crônica.

Dor Crônica Pós-operatória

A dor crônica pós-operatória (DCPO) tem sido foco de diversas investigações nos últimos anos, contribui para solucionar questões ainda incertas sobre o tema, como os possíveis mecanismos de evolução da dor aguda para DCPO. No entanto, ainda há poucos dados consistentes na literatura, de modo que este artigo se propõe a traçar um panorama da bibliografia atual disponível.

Em geral, as opções terapêuticas para a melhoria global da DCPO ainda não estão definidas, o que facilita a ocorrência de incapacidade e da interferência direta na qualidade de vida dos pacientes acometidos. A DCPO tem sido descrita para uma série de doenças de duração variada, caracterizada, principalmente, por uma falta de compreensão dos fatores que iniciaram ou mantiveram seu desenvolvimento. Sabe-se que tais fatores envolvidos nesse processo de cronificação podem ser biológicos, psicológicos e sociais

Definição

A dor crônica persistente pós-operatória (DCPO) é aquela que se mantém por dois meses ou mais após o ato cirúrgico, quando se excluem quaisquer outras causas de dor, como câncer ou infecção crônica.

No período pós-operatório imediato, a ativação direta de nociceptores, a inflamação e a possível lesão de estruturas nervosas provocam, do ponto de vista clínico, dor em repouso ou incidental no local da cirurgia e em região próxima. Há dor evocada pelo toque da ferida cirúrgica, pelo movimento, pela respiração, tosse ou atividade gastrintestinal. Também, se ocorre efetivo dano nervoso, um componente neuropático pode se desenvolver imediatamente após a operação e persistir na ausência de estímulo periférico nociceptivo ou inflamatório.

Desse modo, definir dor neuropática é essencial para elaborar estratégias de prevenção e tratamento da dor crônica persistente. Em geral, existem sinais de lesão de nervo, especialmente após herniorrafias, mastectomias, toracotomias e osteotomias mandibulares. É importante entender que a DCPO é iniciada por um evento e mantida independentemente do que a causou. A dor crônica persistente após cirurgia tem sido o principal fator que interfere no retorno do indivíduo as atividades da vida diária e afeta, assim, sua capacidade e produtividade.

Incidência

Embora pouco documentada na literatura, a incidência de DCPO é muito variável e ocorre tanto após operações de grande complexidade quanto após cirurgias mais simples. Entre 5% e 80% dos pacientes evoluem para dor crônica após procedimentos cirúrgicos, principalmente naqueles que provocam lesões nervosas. A incidência após amputação de membro é de 30% a 81%; após toracotomia e hérnia inguinal, de 11,5% a 47%; após colecistectomia, de 3% a 56% após operação de mama, de 10% a 50%;7 após vasectomia, de 15%;8 após cesárea, de 6% a 18% e após parto normal, de 4% a 10%.9

Essa grande variação na incidência pode estar associada às diversas definições usadas para DCPO nos diversos estudos. Neste estudo, consideramos a definição de Macrae, DCPO é aquela que ocorre após procedimento cirúrgico, com pelo menos dois meses de duração, e não está relacionada com a dor pré-existente ao problema e sem outras etiologias definidas. Outras causas para tal variabilidade são a avaliação e interpretação dos tipos de síndromes dolorosas encontrados e os diversos desenhos de estudos.

Fatores de risco

Dentre os fatores que podem estar ligados à dor crônica persistente pós-operatória estão idade, aspectos socioculturais, obesidade, carga genética, histórico de cirurgias prévias, técnica cirúrgica empregada, isquemia muscular, lesão de nervos, tipo de analgesia e presença de dor pré-operatória.

Presença de doenças dolorosas (síndrome do cólon irritável, migrânea, fibromialgia, doença de Raynaud, dentre outras) e aspectos psicológicos, como medo do procedimento, expectativa da dor e catastrofização da dor, também estão associados.

Pacientes mais jovens que fizeram toracotomia apresentaram maior incidência e intensidade de dor do que pacientes idosos, porém a dor foi controlada mais facilmente.

Ao contrário do que se acreditava, o sexo pode não ter tanta influência sobre o desenvolvimento da DCPO, com achados conflitantes na literatura. Pelo caráter genético, o polimorfismo funcional da catecolamina-O-metiltransferase (COMT) está relacionado com a alteração e exacerbação da sensibilidade à dor.

Na toracotomia, incisões posterolaterais e subcostais contribuem para a ocorrência da DCPO, são mais dolorosas do que as medianas e o uso de afastadores de costelas aumentam ainda mais essa diferenciação, devido à redução da condução elétrica dos nervos intercostais adjacentes.

Já na cirurgia abdominal, técnicas de acesso transversas e oblíquas causam menos dor e comprometimento da função pulmonar do que as abordagens de linha média, particularmente nas primeiras 24 horas, apesar de não existirem diferenças quanto a complicações peri e pós-operatórias e tempo de recuperação. A intensidade da dor pós-operatória imediata também pode aumentar a ocorrência da dor de membro ou da mama fantasma e da dor após colecistectomia.

Um estudo que avaliou fatores relacionados com dor pós-operatória em pacientes doadores de fígado evidenciou que ansiedade e número de analgésicos usados estavam relacionados com a cronificação do processo doloroso.

Vulnerabilidade psicossocial, depressão, estresse, duração da hospitalização e demora no tempo de retorno às atividades cotidianas são, evidentemente, importantes riscos de origem psíquica para dor crônica persistente pós-operatória.

Mecanismos da dor crônica persistente pós-operatória

Os mecanismos da dor crônica pós-operatória são complexos e não totalmente compreendidos. Diferentes mecanismos são responsáveis por diferentes síndromes dolorosas, mesmo em um único tipo de cirurgia.

O estímulo cirúrgico e o trauma tissular que decorre da incisão provocam reação inflamatória pós-operatória que cessa somente com a cicatrização final, facilita, desse modo, o processo de neuroplasticidade e a consequente mudança na excitabilidade da membrana neuronal. Além disso, há uma possível redução dos mecanismos inibitórios centrais e aumento da eficácia sináptica excitatória.

A neuroplasticidade pode ser dividida em dois tipos interligados: a periférica e a central. A neuroplasticidade periférica ocorre a partir da liberação de mediadores inflamatórios (citocinas, prostaglandinas, bradicinina, histamina, serotonina, íons H+) liberados por tecidos lesados ou células inflamatórias, com ativação de cascatas intracelulares que culminam na diminuição do limiar excitatório e podem causar a percepção de dor com um estímulo reduzido (alodinia) ou o aumento da resposta ao estímulo agressivo (hiperalgesia).

Na neuroplasticidade central, de maneira semelhante há amplificação da eficácia sináptica para transmissão dolorosa. Um estímulo nociceptivo periférico pode causar ativação da via intracelular das cinases de proteínas no corno dorsal da medula espinhal e modificar a expressão dos canais iônicos e a densidade de receptores e neurotransmissores que facilitam a hiperexcitabilidade nervosa. Há aumento da atividade e da densidade dos receptores AMPA (ácido aminopropriônico) e NMDA (N-metil-D-aspartato), subsequente produção de óxido nítrico (NO), ativação de cinases de proteínas (PKA e PKC) e outros segundos mensageiros.

O NO estimula a liberação de prostaglandina E2 e, como neumediador transcelular, sai da célula e amplifica a liberação pós-sináptica de aspartato, glutamato e SP e ativa ainda mais os receptores específicos. Assim, o aumento das sinapses glutamatérgicas no corno dorsal da medula, causado pelo estímulo doloroso inicial, reforça a transmissão de novos estímulos nociceptivos e recruta os estímulos não nociceptivos para a via da dor. Ao fim da cadeia de indução da sensibilização central, a responsividade dos neurônios se eleva e mesmos aqueles que normalmente têm uma sinapse ineficaz a estímulos inócuos passam a ativar a transmissão neuronal da dor.

O mecanismo de propagação da dor pós-operatória após lesão direta do nervo periférico é muito variável. A injúria dos nervos importantes que se localizam no campo cirúrgico da maioria dos procedimentos é provavelmente um pré-requisito para o desenvolvimento da DCPO. Em um estudo em toracotomia com e sem proteção do nervo intercostal, na avaliação da dor pós-operatória após dois a sete dias, foi observado menor escore de dor em pacientes que tiveram o nervo intercostal protegido. Entretanto, esse achado não se manteve na avaliação de um mês após o procedimento cirúrgico.

Em outro artigo, os autores fizeram estudo eletrofisiológico em pacientes submetidos à toracotomia e avaliaram a lesão do nervo intercostal antes e três meses após o procedimento, não foi encontrada associação entre lesão do nervo intercostal e dor ou alteração de sensibilidade no fim do seguimento.

Prevenção

A prevenção precoce e tardia da dor pós-cirúrgica é um importante desafio para os anestesiologistas e cirurgiões, uma vez que o tratamento da DCPO é difícil. Na tentativa de melhorar o controle do paciente no período perioperatório e prever a possível dor pós-operatória, mais estudos são desenvolvidos sobre esse tema a cada dia. É necessário educar a equipe médica para que medidas eficazes sejam tomadas e operações desnecessárias e inapropriadas sejam minimizadas.

Estudos em humanos e em animais de experimentação indicam que algumas das alterações neuroplásticas (sensibilização medular) após o trauma podem ser prevenidas por meio do tratamento agressivo da dor aguda.

A hipótese de que a analgesia preventiva pode promover redução clínica significativa na intensidade ou na duração da dor pós-operatória continua, entretanto, sem resposta. Os dados de ensaios clínicos controlados não foram favoráveis, muito embora existam estudos com resultados positivos.

A analgesia multimodal com combinações de fármacos que tenham mecanismos de ação distintos e efeitos aditivos ou sinérgicos parece interferir de forma adequada na complexidade da transmissão dolorosa. A associação de drogas, além de contemplar os diversos alvos inibitórios da fisiopatologia da dor, promove também reduções significativas em seus efeitos adversos pela diminuição das doses necessárias.

No caso dos opioides, há uma queda entre 20% a 40% dos efeitos indesejados, sobretudo para náusea, vômitos e sedação. Os esquemas terapêuticos multimodais têm se focado no uso de opioides, agonistas α2-adrenérgicos, antagonistas da COX, gabapentina, pregabalina, esteroides, antagonistas NMDA e anestésicos locais.

A prevenção da DCPO deve ser feita não somente pelo anestesiologista, mas também pela equipe cirúrgica. Os pacientes submetidos a procedimentos cirúrgicos devem estar cientes do risco de desenvolvimento de DCPO, tendo em vista sua incidência alta. Cada operação eletiva deve ser avaliada cuidadosamente, analisar os benefícios e riscos. A equipe deve conhecer as diversas técnicas cirúrgicas às quais o paciente possa ser submetido, deve escolher, quando possível, a técnica que o expõe ao menor risco de desenvolver DCPO.

A dissecação cuidadosa do campo cirúrgico e técnicas menos invasivas podem ser estratégias na prevenção da dor, evitando lesões de nervos e minimizando o processo inflamatório local. Para toracotomias, a preferência deve ser dada à abordagem anterolateral e técnicas menos invasivas.

Nas cirurgias abdominais, estudos concluíram que o emprego de eletrocauterização pode requerer menor uso de analgésicos no pós-operatório, e que o uso de diatermia iniciado em períodos menores que as primeiras 24 h após o procedimento cirúrgico reduziu significativamente a dor. No exemplo específico das herniorrafias inguinais, procedimento com alto índica de DCPO, o cirurgião deve evitar:

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Tratamento Cirúrgico da Dor Crônica e/ou Neuropática
  • Divisão indiscriminada do tecido celular subcutâneo;
  • Remoção das fibras do músculo cremastérico;
  • Dissecção excessiva do nervo ileoinguinal;
  • Agredir as estruturas neurais (estirar, contundir, cortar, triturar, cauterizar, suturar);
  • Apertar excessivamente o anel inguinal;
  • suturar a margem do músculo oblíquo interno.

Uma escala de probabilidade de risco de desenvolver DCPO que cita alguns preditores, como idade, sexo, dor pré-operatória, tipo de cirurgia, tamanho da incisão, nível de ansiedade, entre outros, foi desenvolvida e validada em pacientes de nível hospitalar e ambulatorial, teve uma boa correlação com o desenvolvimento de dor pós-operatória aguda.

Visto que a presença de dor aguda pós-operatória está associada com risco de evolução para dor crônica, a identificação de possíveis pacientes de risco possibilita que cada vez mais medidas preventivas possam ser tomadas durante todo o período perioperatório na tentativa de bloquear o desenvolvimento de DCPO.

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